Rio -  Quando os Paralamas do Sucesso, em ‘Selvagem’, cantaram “meninos nos sinais, mendigos pelos cantos e o espanto está nos olhos de quem vê o grande monstro a se criar”, eles estavam certamente nos alertando sobre alguns dos graves efeitos da ‘invisibilidade social’ no País, no fim de década de 80. O tema continua atual, sempre, mas como outra resposta sugiro que o artista, além de porta-voz, seja também agente direto de humanização das vias públicas — trata-se de ocupar a cidade e interrogá-la como dimensões do social, político e estética.

Desacreditados, todos nós, de uma política tradicional, é necessário e mesmo urgente dar vida às novas gramáticas políticas de interferência no seio das cidades, tendo as artes um papel fundamental neste debate. A Dança, a Performance, o Circo, a Música, a Literatura, a Poesia, as Artes Plásticas e Visuais, entre tantas outras, precisam estar onde o povo está! Sabe-se que há uma quantidade significativa de gente produzindo arte nas ruas, nas praças, mas onde eles se encontram e promovem tal experiência? Que tipo de fomento recebem para ativar as esquinas? Aparecem, ainda, anônimos e vistos como pedintes na posição arbitrária do governo Kassab em São Paulo? Como subverter esta posição e fazer entender que os artistas de rua, na rua, pra rua são fundamentais na recriação das cidades e revitalização das mesmas em seus meios históricos? Eles trazem o belo, o entretenimento, o bom humor, a memória e a criatividade refutando uma violência gratuita e a fobia simbólica que opera em nós como resposta ao outro.

Por um lado há uma distância entre a cidade e as pessoas, mas por outro há um pulso e uma organicidade latente quando o corpo se move em outra direção nas ruas, suspendendo por sua vez um dado tempo de dominação. Mas, como fazer para que estas ações se tornem contínuas?

Nos cantinhos de cada esquina, onde há solidão e indiferença, nos terrenos baldios e nas avenidas engarrafadas pela movimentação das pessoas podemos estar presentes, afinal é no contato com a cidade e seu cimento que podemos influenciar na construção de novas paisagens urbanas e porque não dizer de uma outra cidade. Um influencia o outro à medida em que o movimento se publica e constrói-se outro trânsito. Então, seja lá qual for as respostas, é tempo de se reapresentar e se reconhecer tatuando o espaço público como espelho da criação, da resistência.

Ah, se essa rua fosse minha...

Paulo Azevedo é professor e doutor em Sociologia pela PUC-RJ